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Quando os pais se separam: E as crianças?

  • Foto do escritor: Cibele Scarpelin
    Cibele Scarpelin
  • 20 de jan. de 2020
  • 4 min de leitura




"O divórcio é tão honroso quanto o casamento. De outro modo, todo o silêncio feito em torno dele fica sendo, para as crianças, como se o divórcio fosse uma 'sujeira', sob o pretexto de esse acontecimento ser acompanhado de sofrimento" (Dolto, p. 22)




Passar por uma separação não é nada fácil. Não se separa somente do (a) parceiro (a), mas também de situações ou formas de ser que não está mais nos fazendo bem. Mas, e no caso do casal ter filhos?


Recebo em meu consultório vários pacientes que se queixam do parceiro(a), mas que dizem não querer se separar por conta dos filhos. "Eles vão sofrer", dizem. O que fazer em uma separação com filhos? Os filhos ficam melhores se não houver a separação? Contar a verdade ou esconder o que está acontecendo?


Um livro que indico para pensar sobre esse assunto é "Quando os pais se separam" da psicanalista francesa Françoise Dolto. Nesse livro, a autora escreve: "O essencial é que os filhos sejam avisados do que está se preparando no início do processo e do que ficará decidido ao final dele, mesmo quando se trata de crianças que ainda não andam"(Dolto, p. 21). É importante que os pais autorizem a criança a poder falar sobre o assunto e fazer perguntas se desejar. O mesmo ocorre em caso de desemprego ou doença na família. A criança deve poder expressar da sua forma o seu sofrimento em relação ao que está acontecendo. Já ouvi relatos de casos em que foi dito para uma criança "seu avô foi viajar", mas na verdade o avô tinha morrido. Nesse caso, pudemos observar sérios danos ao chegar a vida adulta.


As crianças são totalmente capazes de lidar com a realidade em que vivem. É preciso que um adulto a informe de maneira clara da situação que ela está vivenciando. Dessa forma a criança não se sente confusa, fantasiando uma situação. É importante que se dê suporte ao sofrimento dela, e não tentar impedir esse sofrimento: "(...) o divórcio é um fator de amadurecimento. Quando os pais assumem seu divórcio de maneira responsável e eles próprios amadurecem, o filho pode, apesar das provações, conservar sua afeição tanto pelo pai quanto pela mãe. É notável ver a que ponto alguns filhos de divorciados são avançados em seu amadurecimento social e sua autonomia" (Dolto, p. 85).


Muitas vezes acontece do divórcio estar ocorrendo num processo de muito conflito e brigas. Nesse contexto, as crianças podem entender que não são mais amadas e que o divórcio significa uma perda de amor em relação a elas. Sendo assim, Dolto escreve que se deve mostrar e dizer para as crianças que o que está sendo anulado é o acordo que o casal fez ao se casar, e não as responsabilidades e o amor que se tem pelos filhos.


Acontece muitas vezes, também, de um dos genitores depreciar o outro para o filho. Lembre-se, no entanto, que a criança foi gerada por ambos os pais, ela se sente pertencente a ambos, como se os dois genitores fizessem parte dela. Portanto, nessa situação de depreciação, é a criança que se sente desvalorizada pois ela precisa do reconhecimento dos dois genitores, do amor dos dois para se constituir.


Depois que ocorre a separação pode ser que os ex cônjuges não se sintam bem em constituir uma nova família. Já atendi alguns casos em que a mãe, principalmente, não se permitia ter um parceiro, querendo se dedicar totalmente à criança. Sobre isso Dolto comenta:



"Para a criança a partir de cinco anos - menino ou menina -, seria preferível que a mãe e o pai tivessem, cada qual por seu lado, sua própria vida afetiva e sexual, a fim de que a criança não fosse colocada na situação de se considerar, ao mesmo tempo, filha e cônjuge da mãe ou do pai, o que bloquearia sua dinâmica estrutural. É perigoso que a fantasia de ser cônjuge seja como que confirmada pela realidade" (Dolto, p. 39).


É prejudicial para a criança e, ao mesmo tempo muito falso dizer "Me sacrifiquei por você". Tentar gerar um sentimento de culpa é desrespeitar seu crescimento. Depois da separação, é interessante que os pais continuem sendo adultos produtivos, e que não dependam da afirmação da criança.


Sobre as responsabilidades dos genitores, depois do divórcio, a criança precisa sentir que ambos os pais estão cumprindo com seus deveres em relação aos filhos. "Não é indiferente para o filho que seu pai não pague uma pensão para ele" (Dolto, p. 58). É claro que hoje temos várias situações diferentes do que se tinha antigamente em relação a pensão e a guarda dos filhos, porém o que se retrata aqui é que a falta de responsabilidade dos genitores em relação as crianças pode fazer com que elas cresçam com menosprezo em relação às suas próprias responsabilidades "Se meus pais não cumprem com os deveres, por que eu preciso?". Além disso, quando os pais moram perto é prejudicial para as crianças que o pai, por exemplo, só tenha o direito de ver as crianças em dias fixos. Deve ser respeitado, quando possível, o desejo de um filho ir ver o pai: "(...) quando moram na mesma cidade, as relações de afetividade ficam desumanizadas ao serem regidas pelos dias da semana, e não pelas afinidades entre uns e outros" (Dolto, p. 65).


Tendo todas essas questões para resolver, cuidar da criança e a respeitar, o casal precisa ainda passar por todo um processo emocional durante a separação, que na maioria das vezes não é feita sem dificuldades. Se perceber que o sofrimento e os afetos estão muito difíceis de lidar, é importante procurar um profissional para ajudar a passar por esse momento, e com certeza, quando os filhos percebem que os pais estão passando por uma dificuldade a enfrentando de modo maduro, eles tem muito a ganhar em experiência para resolver suas próprias dificuldades.


Dolto, Françoise. Quando os pais se separam. 2. ed. - Rio de janeiro: Zahar, 2011.

 
 
 

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