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Deixe chorar: sobre a tristeza na adolescência

  • Foto do escritor: Cibele Scarpelin
    Cibele Scarpelin
  • 24 de jan. de 2020
  • 3 min de leitura

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"(...) sempre existem, em todo adolescente, momentos em que afloram ideias de suicídio - que não devem ser tomadas por tentações de pô-lo em prática. É aí que a escuta de um adulto não angustiado, e que deixe o adolescente falar sem censurá-lo pelo sentimento depressivo que ele deixa registrado em sua confidência, é nesse ponto que tal escuta - sem que o próprio adulto se aperceba - torna-se o suporte do 'parto do cidadão' que a passagem da adolescência representa: uma passagem que implica o luto e o abandono da própria infância no passado, sem nostalgia" (Dolto, p.93)



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"Eu não posso chorar". É com essa frase que alguns adolescentes chegam carregando em meu consultório, além de eu ter escutado muito isso também como professora.


Temos no Brasil as campanhas do "Janeiro branco", pela saúde mental e emocional e o "Setembro amarelo", campanha de prevenção ao suicídio. São momentos importantes para tratar desses assuntos de forma coletiva, conscientizar a população e fazer divulgação de locais de acolhimento e ajuda. Porém, muitas vezes, as histórias que são transmitidas nesses momentos deixam os pais desesperados e vão procurando nos filhos, ao menor sinal de tristeza, um diagnóstico de depressão.


O que tenho escutado de alunos e pacientes adolescentes é a dificuldade que eles sentem de chorar. Eles dizem de uma angústia que percebem nos pais ao vê-los chorar. Os pais não conseguem suportar - nem dar suporte - e validar a tristeza dos filhos.


A impressão que tenho é que muitas vezes os pais vão ouvindo as histórias e ficam com medo. São muitos relatos de depressão na adolescência e alguns de suicídio. Basta então ver o filho chorando, que o diagnóstico vem da internet mesmo: é depressão!


No entanto, a adolescência é um estado de passagem, um período lento e doloroso, um processo de luto e renascimento: "Por trás dos comportamentos angustiados, tristes ou revoltados do adolescente neurótico, esconde-se no fundo dele um lento, doloroso e surdo trabalho interior de afastamento progressivo da criança que foi, mas de construção igualmente progressiva do adulto futuro" (Nazio).


A partir disso, podemos considerar que o choro nessa fase (e em, qualquer outro momento da vida) é uma forma de lidar com sentimentos difíceis e contraditórios, e não é motivo de preocupação. Se o adolescente tiver perto dele adultos capazes de dar suporte nesse momento, a crise vai passando e deixando uma lição importante: a tristeza faz parte da vida.


Mas, como saber se essa crise é preocupante? Quando procurar ajuda? Pela minha experiência, muitos adolescentes pedem ajuda para os pais, pedem para começar um tratamento psicológico, mas muitos pais consideram "frescura". Esteja atento para esse pedido de ajuda. Em outros casos, os adolescentes não pedem ajuda e alguns a recusam. Sendo assim, é interessante que os pais procurem ajuda profissional quando perceberem que estão preocupados com a situação dos filhos e não estão conseguindo lidar com isso. O momento de crise tende a melhorar muito quando os pais procuram ajuda psicológica e passam a conseguir suportar e dar suporte à angustia dos filhos.


Na maioria das vezes, querer ficar trancado no quarto não é sinal de depressão: é só sinal de que se quer ficar sozinho mesmo. Mas a nossa época anda se incomodando muito quando alguns sentem essa vontade.


Ao invés de pesquisar "depressão" na internet, leia o livro "Solidão" de Françoise Dolto. Essa é a minha indicação de "remédio" para a angústia de ficar sozinho ou de ver o outro querer ficar só.


Bibliografia

Nazio, J.-D. Como lidar com um adolescente difícil? Um livro para pais e profissionais. Rio de Janeiro: Zahar. ISBN: 978-85-378-0739-2.

Dolto, Françoise. Quando os pais se separam. 2ª ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.


 
 
 

1 comentário


Karol Lopes
Karol Lopes
24 de jan. de 2020

Interessantíssimo tudo o que foi falado ... parabéns!!!!

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